Lúcia já vou indo
Lúcia Já-Vou-Indo
Maria
Heloísa Penteado
Lúcia Já-Vou-Indo não sabia
andar depressa de maneira nenhuma. Andava devagar, falava devagar, chorava e
ria devagarzinho e pensava mais devagar ainda. Muito natural, pois ela era uma
lesma.Um dia, Lúcia recebeu um convite para uma festa. Levou o dia inteirinho
para ler o bilhete que dizia assim:
"Chispa-Foguinho, a
libélula, convida você para uma festa dançante, embaixo do Pé de Maracujá, às
oito horas da noite do dia 30 de janeiro. Comes e bebes, muita música, muita
alegria, tudo do bom, do melhor e de graça".
Mal acabou de ler, Lúcia já
se foi preparando para a festa. Queria se pôr a caminho imediatamente, embora
faltasse ainda uma semana.
- Juro que vou chegar na
hora! -disse para si mesma. E começou a lembrar as muitas festas que havia
perdido por chegar sempre atrasada. Ao aniversário da Maroquinha Cocinela, que
era sua vizinha, chegou um dia depois da festa. Ao casamento do grilo João das
Pintas com Sarapintada, chegou tão tarde que foi encontrar o casal já com um
filhinho.
Nesse instante, o relógio da
sala bateu três horas da tarde e Lúcia teve um sobressalto. Pois não é que já
perdera duas horas pensando naquelas coisas? E começou a se arrumar
afobadamente. Pôs na cabeça uma peruca de cachinhos com um laçarote de fita
cor-de-laranja, e com isso perdeu um dia inteirinho.
Encheu uma cesta com
brotinhos de alface para ir comendo pelo caminho, e lá se foi mais um dia. Deu
corda no relógio para que não parasse na sua ausência e outro dia perdeu. Só
faltava fechar a casa e ela perdeu nesse serviço mais um dia. Enfim a molenga
se pôs a caminho, tendo exatamente três dias para chegar ao Pé de Maracujá que
não era muito longe.
Chegou o dia da festa e ela
ainda estava andando. Pelo caminho encontrou muita gente que também ia para lá.
Viu dona Içá, com a cinturinha apertada num cinto de fivela de ouro, de braço
dado com o marido de camisa listada e boné. Viu Lili Taturana toda besuntada de
brilhantina para que seus pelinhos não ficassem arrepiados. Viu Zé Caramujo de
cachecol xadrez enrolado no pescoço. Viu as formiguinhas Quem-Quem numa longa fila,
comportadas e quietinhas como meninas de orfanato a passeio num domingo.
Viu abelhas, besouros,
pernilongos, vespas e mil outros bichinhos. Todos passavam por ela e sumiam ao
longe.
- Depressa, Lúcia, assim
você não chega! - diziam de passagem.
E ela respondia mastigando
devagarzinho um brotinho de alface:
- Já vou indo... Já vou
indo... - e se esforçava, pensando que estava andando um bocadinho mais
depressa.
Enfim, ela começou a ouvir a
orquestra das cigarras. Estou pertinho, pensou. Mais algumas horas e estou lá.
E seu entusiasmo era tamanho que até conseguiu, de fato, andar um pouquinho
mais depressa.
- Olha a pedra no caminho! -
gritou nesse instante João Barata do Mato, que também ia indo para a festa.
Aviso inútil, porque Lúcia
Já-Vou-Indo a viu muito bem. Era a Maria Redonda, uma pedra perversa que
gostava de pregar peças nos outros.Ficava sempre no meio do caminho, de
propósito, para que tropeçassem nela e caíssem. Então ria de se sacudir toda.
Eu vou me desviar dela,
pensou a lesminha. Mas a coitada pensava mais devagar ainda do que andava. Por
isso não teve tempo de se desviar. Tropeçou e caiu. Mas não se machucou porque
caiu muito devagarinho.. tão devagarinho que a pedra nem achou graça.
Lúcia levantou-se, arrumou a
peruca que se havia entortado na cabeça e foi buscar a cestinha que havia
rolado longe. Nisso, perdeu um dia e mais outro.
Quando chegou ao Pé de
Maracujá, não havia mais nem sinal da festa, a tão esperada, comentada e
suspirada festa. Quem achou graça no caso, foi o Pé de Maracujá. Começou a
bater uma folha na outra e a cantar assim:
"A Lúcia
Já-Vou-Indo Vinha vindo, vinha vindo,
Tropeçou numa pedrinha, Foi
caindo, foi caindo!"
Mas Lúcia não achou graça
nenhuma. Chorou muito o seu chorinho vagaroso de lesma: uma lágrima por hora,
um soluço a cada meia hora.
Chorou, chorou, mas seu
choro manso não conseguiu acordar a libélula Chispa-Foguinho que dormia cansada
da festa. Ela só escutou o chorinho da lesma no outro dia, quando acordou.
- O que será isso? - a
libélula disse e foi espiar. Viu a pobre Lúcia chorando, compreendeu tudo e
ficou morrendo de pena. Foi buscar uns docinhos que sobraram da festa e
ofereceu-os a Lúcia.
Conversou bastante com ela
para ver se a consolava, e nada. Lúcia Já-Vou-Indo continuava com o seu choro
em câmara lenta e depressa a libélula se cansou. Numa última tentativa, ela
disse:
- Sabe, Lúcia, quem vai dar
uma festa agora é você. Sendo a festa na sua casa, é impossível você chegar atrasada.
A lesminha ficou pensando
naquilo e, como pensava muito devagar, a libélula chamou as irmãs e, ligeiras
como foguetinhos, foram à casa de Lúcia, prepararam tudo e distribuíram os
convites.
Credo! A família da libélula
era toda elétrica. Zás-trás e tudo ficou pronto. Só faltava colocar a Lúcia
dentro de casa para receber os convidados.
Enquanto isso, Lúcia
Já-Vou-Indo, que já tinha acabado de pensar e estava encantada com a idéia,
vinha vindo o mais depressa que podia. Talvez, dentro de alguns dias se não
tropeçasse outra vez na pedra Maria Redonda estivesse em casa.
E a libélula Chispa-Foguinho
tinha agora um problema: os convidados já estavam chegando e a festa não podia
começar porque a dona da casa estava fora. Como trazer Lúcia o mais depressa
possível? ".
Cric!... A libélula deu um
estalinho. Já descobrira a solução. Num abrir e fechar de olhos, explicou tudo
às irmãs e foram buscar a Lúcia.
Puseram a molenga em cima de
uma folha de capim e vieram voando trazendo a folha pelos ares. Danadas como
elas só, em dois minutos a lesma estava em casa. Isso, apesar de ter caído da
folha três vezes.
Foi assim que ,oh maravilha!
Pela primeira vez na vida, Lúcia já vou indo assistiu a uma festa inteirinha,
do começo ao fim.
Reduzida
Lúcia Já-Vou-Indo
Maria Heloísa Penteado
Lúcia Já-Vou-Indo não
sabia andar depressa. De maneira nenhuma. Andava devagar, falava
devagar,chorava e ria devagarinho e pensava mais devagar ainda.
Muito natural, pois
ela era uma lesma.
Um dia, dia Lúcia
recebeu um convite para festa. Levou o dia inteiro para ler o convite que dizia
assim:
“Chispa-Foguinho, a
libélula, convida você para uma festa dançante, embaixo do Pé de Maracujá, às
oito horas do dia 30 de Janeiro. Comes e bebes, muita música, muita alegria,
tudo de bom, do melhor e de graça.”
Mal acabou de ler,
Lúcia já foi se preparando para a festa. Queria se pôr a caminho imediatamente,
embora faltasse ainda uma semana.
_ Juro que vou chegar
na hora! _ disse para si mesma. E começou a lembrar as muitas festas que havia
perdido por chegar sempre atrasada.
Nesse instante, o
relógio da sala bateu três horas da tarde e Lúcia teve um sobressalto.
Pois não é que já
perdera duas horas pensando naquelas coisas? E começou a se arrumar
afobadamente.
Pôs na cabeça uma
peruca de cachinhos com um laçarote de fita cor-de-laranja, e com isso perdeu
um dia inteirinho.
Encheu uma cesta com
brotinhos de alface para ir comendo pelo caminho, e lá se foi mais um dia. Deu
corda no relógio para que não parasse na sua ausência e outro dia perdeu.
Só faltava fechar a
casa e ela perdeu nesse serviço mais um dia.
Enfim a molenga se
pôs a caminho, tendo exatamente três dias para chegar ao Pé de Maracujá que não
era muito longe.
Maria Heloísa Penteado